Lembro-me bem daquele dia em que encafuados nos casacos e enfaixados nos cachecóis marcávamos o passo pela calçada abaixo de mão dada. O vapor da nossa respiração confundia-se com o fumo das castanhas assadas enquanto chegámos à esquina da praça. Não era o ano mais farto da história da cidade e isso reflectia-se na menor quantidade de luzes nas ruas. Felizmente os cidadãos sabendo das dificuldades da urbe decidiram colorir as suas janelas com luz e cor, pois embora a estação assim o pedisse, o brio cívico falava mais alto.
Canções familiares ecoavam nas lojas e nas ruas por entre transeuntes apressados para chegar a casa. Em autocarros e eléctricos decorados a rigor pude ver as faces de miúdos e graúdos enfeitiçados pelo brilho dos artesãos da luminária. Todos eles crianças deslumbradas vez após vez como se um feito de magia lhes tivesse sido apresentado.
Tu largaste-me a mão para me agarrares o braço com as duas mãos e para te apoiares em mim enquanto caminhávamos. Querias estar mais próximo de mim e eu de ti. Eu que pouco mais tinha para te oferecer do que a meia dúzia de tostões no bolso e a minha companhia, senti-me em êxtase por teres aceitado o convite para passear.
No fim da rua principal esperei que olhasses para cima em contemplação do efeito dominó dos arcos reluzentes e lentamente sussurei-te ao ouvido "Era este o meu sonho! O de ver as luzes de natal contigo para te dar esse sorriso que te faltava à tanto tempo!" Sorriste amplamente duma forma cândida mas não respondeste. O teu olhar já tinha dito tudo.